A Terça Literária
de hoje expressa um pouco da minha revolta, e indignação ao ver cidade onde
moro, Cuiabá – MT, que em meio a
confusões e escândalos sobre corrupção e a precariedade da saúde no estado,
está maquiando a situação e se preparando para receber jogos da Copa do Mundo.
O Texto de hoje é
de Gregório de Mattos, nosso querido Boca do Inferno. Em seu Epigrama ele se
referia à situação do Bahia nos anos 50, mas parece ter sido escrito ontem, e se
encaixa perfeitamente a grande parte do nosso Brasil.
Epigrama – Gregório de Mattos
Que falta nesta
cidade?... Verdade.
Que mais por sua
desonra?... Honra.
Falta mais que se
lhe ponha?... Vergonha.
O demo a viver se
exponha,
Por mais que a
fama a exalta,
Numa cidade onde
falta
Verdade, honra,
vergonha.
Quem a pôs neste
rocrócio?... Negócio.
Quem causa tal
perdição?... Ambição.
E no meio desta
loucura?... Usura.
Notável desventura
De um povo néscio
e sandeu,
Que não sabe que
perdeu
Negócio, ambição,
usura.
Quais são seus
doces objetos?... Pretos.
Tem outros bens
mais maciços?... Mestiços.
Quais destes lhe
são mais gratos?... Mulatos.
Dou ao Demo os
insensatos,
Dou ao Demo o povo
asnal,
Que estima por
cabedal,
Pretos, mestiços,
mulatos.
Quem faz os círios
mesquinhos?... Meirinhos.
Quem faz as
farinhas tardas?... Guardas.
Quem as tem nos
aposentos?... Sargentos.
Os círios lá vem
aos centos,
E a terra fica
esfaimando,
Porque os vão
atravessando
Meirinhos,
guardas, sargentos.
E que justiça a
resguarda?... Bastarda.
É grátis
distribuída?... Vendida.
Que tem, que a
todos assusta?... Injusta.
Valha-nos Deus, o
que custa
O que El-Rei nos
dá de graça.
Que anda a Justiça
na praça
Bastarda, vendida,
injusta.
Que vai pela
clerezia?... Simonia.
E pelos membros da
Igreja?... Inveja.
Cuidei que mais se
lhe punha?... Unha
Sazonada
caramunha,
Enfim, que na
Santa Sé
O que mais se
pratica é
Simonia, inveja e
unha.
E nos frades há
manqueiras?... Freiras.
Em que ocupam os
serões?... Sermões.
Não se ocupam em
disputas?... Putas.
Com palavras
dissolutas
Me concluo na
verdade,
Que as lidas todas
de um frade
São freiras,
sermões e putas.
O açúcar já
acabou?... Baixou.
E o dinheiro se
extinguiu?... Subiu.
Logo já
convalesceu?... Morreu.
À Bahia aconteceu
O que a um doente
acontece:
Cai na cama, e o
mal cresce,
Baixou, subiu,
morreu.
A Câmara não
acode?... Não pode.
Pois não tem todo
o poder?... Não quer.
É que o Governo a
convence?... Não vence.
Quem haverá que
tal pense,
Que uma câmara tão
nobre,
Por ver-se mísera
e pobre,
Não pode, não
quer, não vence.
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Beijinhos